segunda-feira, 17 de março de 2008

Vipassana

No dia 26, saímos do vipassana. Experiência única, linda, inesquecível. Os dez dias foram incríveis, muito frios, mas seguíamos vivas.

No primeiro dia acabei tomando um banho gelado porque no banheiro em que entrei estava sem água quente e, ai, quase morro congelada. Nos outros dias deu para tomar banho frio (atenção, não era congelante! Uma glória!) e só nos últimos 2, como prêmio de consolação, realmente quente.

Passar os 10 dias em silencio nem foi tão complicado como imaginei a princípio. Até porque estavam todos em silêncio, o que te deixava com menos vontade de falar. As dúvidas sempre podiam ser tiradas com o professor (o que permitia o intercâmbio de palavras uma vez a cada dois dias) e se necessitássemos qualquer coisa (como cobertores extras) podíamos pedir para as voluntarias. De resto o silencio era total. Fora uma italiana que não conseguia ficar quieta e de vez em quando falava dormindo, sozinha e ainda por cima cantava nas hoas livres. Homens e mulheres ficavam em lugares separados, só se encontravam durante a meditação, porque só havia um professor.

Dormíamos em uns barracões divididos em seções. Cada seção tinha 3 camas e só. Os banheiros eram compartidos. Tudo muito simples. E não emagrecemos nada (uma lástima!) porque comida foi uma coisa que não faltou. Fizemos 3 refeições diárias ( uma as 6:30, outra as 11:00 e a ultima as 05:00) e, de verdade, não fiquei com fome. Acordar as 4:00 foi triste. No primeiro dia tudo bem, é novidade, mas conforme o tempo vai passando vai ficando mais e mais difícil. A preguiça vai chegando, o frio vai querendo tomar conta e a vontade de ficar embaixo das cobertas por mais um tempo fica cada vez maior. Ótimo para vencer tudo isso. Eu não esperava o despertador tocar duas vezes. Já dormia pronta, pulava da cama correndo pra lavar o rosto, escovar os dentes e me esconder no sala de meditação, essa sim uma sala com paredes de verdade. Devo confessar que creio ter cochilado algumas vezes na primeira meditação matutina.

O dia mais difícil foi quando nos foi pedido por primeira vez a imobilidade completa por umas 3 horas. Tudo gritava, cada parte do corpo. Senti como milhares de agulhas fincadas na minha pele. Queria me mover, mas sabia que não podia. E não queria. Queria vencer isso.E então tive o corpo inteiro coberto de sensações e tive consciência de cada parte do meu corpo. Foi difícil voltar a me mover. Todos, ao final da meditação se levantaram correndo e foram para fora movimentar o corpo. Eu não consegui. Tive que mover cada junta lentamente. E quis chorar em cada movimento. Depois, a dor passou, como tudo mais. E a partir daí, ficar imóvel, bom, não é que ficou fácil, mas se se podia fazer uma vez, podia fazer duas, três, quantas fossem necessárias.

Meditaçao não faltou. A técnica, propagada por Goenka, é supostamente aquela deixada por Budha, na sua forma pura, e não distorcida pelos anos. Permite a gente de todas as religiões praticá-la. Começa com o prestar de atenção na respiração e numa pequenina parte do corpo.
Depois a atenção vai passando às sensações. Segundo Budha, tudo começa na mente, é criado na mente, depois se plasma no plano físico. E quando você se conhece, mental ou fisicamente passa a compreender a lei da natureza (afinal, faz parte dela) – “Conhece-te a ti mesmo e conhecerás o universo”.

Aprendemos a aceitar que tudo passa. As sensações passam, as dores passam, e assim também passa a vida. Se educamos a mente a compreender que as sensações do corpo não são permanentes, podemos fazê-la entender que NADA é. E aprenderemos a aceitar tudo. Daí a questão do desapego e não identificação. Para mim foi uma experiência muito forte, não só pela dificuldade de ficar imóvel, ou pela de tentar ficar sem pensar (impensável isso para mim) por pelo menos 10 horas diárias.

O mais forte me passou no sétimo dia. No intervalo para o chá me passou pela cabeça que minha mãe tinha morrido e que ninguém tinha como me avisar. E foi tão forte a sensação que meio que desesperei. Ate porque sempre disse para mim mesma que se alguém na minha família morresse e eu não estivesse presente saberia que essa pessoa morreu porque ao pensar nela começaria a chorar. E foi o que aconteceu. Me tranqüilizei, dizendo que era só um pensamento, que estava tudo bem e que ia passar.

Mas naquela noite, no discurso, o professor contou uma historia de Budha que fala que não existe uma família sem morte e eu me dei conta que na minha não, pelo menos desde que eu nasci, ou desde que era muito pequena para lembar. Ainda assim tentei ficar tranqüila. Mas no outro dia a história não saia da cabeça e durante uma das meditações entrei em pânico. Uma das assistentes disse que eu podia faltar a próxima hora para eu me acalmar e que ela ia falar com o professor. Depois fui eu falar com ele, que me explicou que neste processo é normal esse tipo de coisa, que é para perder o apego, limpar a mente, que é normal que aconteça, já que ali, estamos todos mais sensíveis. Mas que se eu quisesse eles davam um jeito de entrar em contato com minha mãe para ver se estava tudo bem.

Sei que depois disso foi muito difícil porque a dúvida era se era realmente parte do processo ou era uma intuição. Resolvi entregar a Deus, se minha mãe estivesse morta, não poderia fazer mais nada por ela. Sim que poderia pela minha família, mas eles sabiam que eu estava inacessível.
Foi muito, muito bom, para me dar conta de que realmente devemos dizer todos os dias TE AMO às pessoas que realmente queremos porque podemos não estar presentes quando estas se forem. Para elas não fará mais diferença, afinal, já não estarão entre nós, mas para nós, a sensação de que poderíamos ter dito mais vezes, permanece.

Assim, que quando saímos esperei impacientemente dar um horário decente no Brasil (8 horas de diferença) e liguei pra casa. Ainda levei mais um susto, já que atendeu o pai do meu irmão, que quase nunca está no Matutu. Mas, afinal, era só um processo mesmo. Minha mãe seguia viva, muito viva.

O vipassana foi ótimo para aceitar a Índia nos 3 meses que se seguiram. Equanimidade era a palavra chave. Embora nem sempre funcionasse, equilibrou muito. E me fez muito mais serena (pelo menos enquanto tive lá?). Seguimos meditando 1hora, duas vezes por dia, por mais algum tempo. Mas nao durou a viagem toda. A princípio colocamos a culpa em, muitas vezes, termos que acordar ainda de madrugada. E depois, chegávamos cansadas. Justificativas nao faltam. Persistenica sim.

Agora, a parte que foi engraçada. Primeiro, nunca vi tantos macacos. Matutu é fichinha. Até no meio da cidade, você andando pela rua, tropeça em alguns. Lá retiro eram famílias de 30 macacos passando o tempo inteiro. Desde macacos grandes aos filhotinhos mais fofos. Só éramos aconselhados a não encarar nem sorrir porque eles tomam isso como desafio e se tornam bastante agressivos. Mas as vezes era impossível, até porque passavam a uma distância tão curta que poderia tocá-los.Fora a confusão que faziam durante a meditação, ficavam andando nos telhados, que eram de telhas de alumínio e, nossa, uma barulheira tremenda, parecia que tudo estava vindo abaixo.

Ao sairmos do vipassana resolvemos nao voltar ao mesmo hotel. Acabamos indo nos hospedar no monastério Tschaselink, que ficava descendo uma escadaria imensa, inacabável, mal iluminada pela noite, mas um exercicio muito bom de subir e descer (fora quando tivemos que subir com a mochila, acho que demoramos meia hora). Um pouco mais caro, mas muito, muito mais tranquilo e proprício a nós, ainda meio no mundo da lua.

Próxima sessão cultural. Vocês sabem porque a comida da Índia é tão apimentada??? Diz a lenda que é porque em muitas partes se comia comida estragada e a pimenta serviria para esconder o gosto!!!!! Blergh!

Próxima sessão nomes. Já sabem o que meu nome significa eu em hebraico. Agora, em japonês, significa "o irmão mais velho". Imaginem a situação. Eu, no Japão, tentando me apresentar. “Oi, eu sou o irmao mais velho”. Primeiro iam achar que estou falando errado e perguntar: Você quer dizer a Irma mais velha? Irmã mais velha de quem?” E eu digo, “não, sou o irmão mais velho!!!” Pronto, ou, de novo vão me achar maluca ou vão achar que sou travesti!

Conclusão: não posso ir para Israel nem para o Japão, e, por favor, tenham cuidado ao por nomes nos filhos... podem estar chamando eles de repolho ou ate abobrinha e como sabem, o nome influencia a personalidade, então seus filhos ou vão soltar muito pum (repolho da gases, sabiam?) ou só vão falar besteira...

2 comentários:

Anônimo disse...

A "intuição" da nnorte de um ser querido exemplifica como a mente cria sua própria realidade.

Anônimo disse...

Bela história !!!!!!