sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Depois da desertica dourada cidade de Jaisalmer fomos a Jodhpur. Nao gostamos, tanto que so passamos uma noite e no dia seguinte partimos de volta a Pushkar. Eu tambem por uma noite porque de la parti para Udaipur. Outra cidade no Rajastao. Linda. Mas como dizer, depois de Jaisalmer ja nao precisava ver nada... Nao tinha vontade de turistear por ai. JA vi suficientes contrucoes lindas, tipicas da India. Lagos tambem. Esta certo que Udaipur tem um lindo palacio no meio do lago, mas nem isso tinha muita vontade. Pelo qual voltei a Pushkar.

Por que? De novo? E, pois descobri que de Ajmer, uma cidade pertinho de Pushkar, sai um trem para o sul. Para o extremo sul. Dai que por alguma obra do acaso consegui uma passagem. Obra do destino porque o tem ja estava totalmente cheio. Nem quota de turista tinha mais. Mas consegui. E acabei descendo em Gokarna.

Gokarna esta no estado de Karnataka, na costa do Mar Arabico. Gokarna em si e uma vliazinha agradavel, com lojas e praia. Mas os turistas ficam mesmo nas praias ao redor. Fiquei na primeira, Kuddle Beach, para mim a melhor. Sem tantos vendedores ambulantes nem tantos indianos querendo checar as mulheres em bikini. Embora ate seja engracado ver a cara deles. Nas praias seguintes, de quando em quando e com sorte se podem ver golfinhos.

Pois algo de sorte tivemos. Porque depois de 1 1/2 horas de caminhada chegamos a Paradise Beach. Uma prainha pequena e agradavel, bem escondida entre as pedras. Algumas Guest House e dois ou tres restaurantes. Ao fundo, 1 km de distancia, golfinhos divertindo-se na agua. E logo antes de irmos embora, de barco, uma cauda a uns 20 metros nos acenou adeus. Lindo demais.

Todas essas praias tem algo em comum. Primeiro, claro, o calor. Quase insuportavel. E olha que sou brasileira. Depois a falta de sombra. Nem meia sombra para se esconder. E ninguem aqui aluga guarda-sol. Nao, essa grande descoberta ainda nao chegou aqui. Tambem nao se pode esconder embaixo das palmas e coqueiros ja que as guest house e restaurantes estao ali. Ou seja, ou se passa o dia comendo ou se esconde dentro do quarto.

Mas vale a pena. Uma linda praia. Lindas ferias. Mar de aguas escuras e tranquilas. Nada de ondas. Tambem nada de vento para ajudar a refrescar, mas enfim, nada e perfeito. Nem mesmo a India.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Tanto tempo sem escrever que nao sei nem por onde comecar... O festival de yoga de Rishikesh terminou e ficou a sensacao de quero mais. Pensava em ir ao Nepal depois do festival mas acabei mudando meus planos. No ultimo dia de Rishikesh aproveitei para despedir-me em alto estilo. Fui com duas amigas a cachoeira. Limpa, linda, ate para mergulhar deu. De bikini ja que nao havia nenhum indiano por perto. Um dia perfeito de sol, um lugar perfeito para meditar, para dizer adeus ao paraiso. Para desapegar da sensacao de casa que Rishikesh me despertou.

Um dia depois peguei um onibus para Pushkar. Cheguei pensando o que vim fazer aqui? Por que vim para essa cidade totalmente dedicada a compras? Pushka era uma cidade linda ha alguns anos, quando havia um lindo lago no centro e um fantastico por do sol. Hoje do lago so existe o buraco. Segundo uma das historias, tiraram a agua de dentro, para limpar o lago, que estava com 75% da capacidade cheio de areia. Tiraram a areia. Quando voltaram a colocar a agua, a terra absorveu. E o lago, no meio do deserto, ficou so no buraco. Ha 4 anos que nao chove... A cidade ainda e sagrada, e sempre o sera, claro. Diz a lenda que Brahma deixou, com suas maos, cair tres flores sobre a India, 3 lugares sagrados,3 Pushkar. A que fui e a mais importante, reune deserto, montanhas, verde e agua. Bom, isso ha alguns anos atras.

Mas acontece que Pushkar nao e so compras, foi o que descobri. A cidade em si e para os compradores. Lojas, lojas e mais lojas. Gente, gente e mais gente. Mas em Pushkar encontrei inesperadamente um amigo que conheci em Rishikesh. Juntos alugamos uma moto e nooossa, nem sei explicar. Nos adentramos nas aforas da cidade. O deserto a volta. Partes incrivelmente verdes, trabalhadas pelas maos humanas.

E as pessoas, os olhares mais penetrantes que jamais vi. As mulheres, desde cedo, trabalhando duro no campo, casadas, com filhos. Poucos sorrisos nas fotos, mas coracoes enormes se abriam. Pouco a pouco os sorrisos surgiam. Meninas timidas tocavam meu cabelo. Me abracavam como amigas antigas. Nao sei se ja haviam visto gente branca. Continuo sem saber.

Em um lugar nao tao longe nos receberam como familia. Nos ofereceram chai. Passamos a tarde conversando. Eu tinha a sorte que meu amigo sabia falar hindi. Nao queriam que fossemos embora. Que voltassemos todos os dias para sentar, comer, tomar chai, conversar. Ao lado da terra uma montanha se erguia. No topo da montanha um templo. La fomos ver o por do sol. O mais incrivel dos ultimos tempos. Aos nossos pes se extendia o deserto e o silencio. O ceu nos abracava. A noite chegou e nao queriamos descer. A terra se misturou com o ceu, ambos negros, estrelas no ceu, luzes na terra, a lua nos iluminava a descida.

Foi como descer do paraiso. Foi como abrir mao do ceu. Voltar para a cidade barulhenta. Voltar para o paraiso das compras. Enfim, voltar a terra.

De Pushkar vim para Jaiselmer. Ainda mais desertica, mais perto da fronteira com o Paquistao. Aqui fiz um Camel Safari. Dormi no deserto, em meio as Dunas. Separando-me da areia apenas um plastico. Separando-me do ceu, uma montanha de mantas. A lua quase cheia nos observava la em cima. Vi cervos correndo aqui e acola. Vi aguias voando baixo no nascer do sol. Andar a camelo nao e tao confortavel, os pes balancando la em cima. O movimento demasiado forte, pra ca e pra la. Ao final ja quase queria pedir arrego, prefiro caminhar.

Jaiselmer tambem e conhecida como Golden City. Muitas construcoes em pedra. Detalhes esculpidos na propria pedra, flores, petalas, mandalas. Coisas so possiveis na India. So possiveis ha muito tempo, quando as pessoas tinham tempo para dedicar-se a construir obras perfeitas. Uma parte da cidade esta dentro de muralhas. Templos e palacios a enfeitam. Como uma cidade saida das 1001 noites.

O deserto em volta a silencia, majestosamente refletindo o poder do sol.

domingo, 8 de novembro de 2009

Domingo de sol, domingo de descanso. Em vez de ir ao festival e me encher de aulas de milhares de coisas fui com a Pao a uma prainha longinqua e tranquila a beira do Ganges. Ali passamos a manha. Senti por primeira vez que realmente estava aproveitando o estar em Rishikesh, o estar perto de um rio tao sagrado e aproveitar a energia dele para meditar.

Ali, em meio a natureza, ouvindo o borburinho sagrado do Ganges, sentindo a areia branca sob os pes, me senti em conexao com a Unidade. E foi facil meditar. Porque a maior expressao de Deus e a propria natureza. E me dei conta que sempre tive dificuldade de meditar entre 4 paredes, mas ali parecia ser algo natural. Tambem sempre tive dificuldade de identificar Deus em uma imagem. Ou orar olhando alguma imagem. Porque Deus para mim e a consciencia de cada momento, e a essencia de cada um e a uniao de todas as essencias. Deus e a Unidade, e amor. Nao posso colocar uma forma no amor. Nao consigo dar uma forma a Unidade. Mas entendo que para muitos seja mais facil rezar espelhando Deus, ou uma concepcao de Deus em alguma imagem. Cada um tem seu metodo de conectar-se com o divino e todos sao validos.

Sentei na arei branca, a beira do rio e meditei. Pensei nas semelhancas entre o percurso do Ganges ou de qualquer outro rio com a nossa vida. O percurso com turbulencias ou nao, mas sempre chegando de um jeito ou de outro, no mesmo destino. Tambem passamos por turbulencias, sofrimentos impostos pela vida. Sofrimentos e dores que baqueiam nossa personalidade, nossos egos. Mas o destino final, tambem e sempre o mesmo, a reuniao com a Unidade.

Se paramos para pensar que a cada vida (para aqueles que acreditam em reencarnacao) temos uma personalidade diferente, somos uma pessoa diferente, entendemos o quao ilusoria e a ideia que temos de nos mesmos. Porque a personalidade, os egos, nao sao mais que uma ilusao, nossa verdadeira essencia e a unica realidade. E se a personalidade e ilusao, porque sofrer? Os sofrimentos e preocupacoes que a vida nos apresenta somente doem no ego. A essencia continua intacta.

Vai vida, vem vida, passamos pelas mesmas provacoes, vivemos em Maia ate que entendemos que nao existimos, nao a concepcao que temos de nos. Os sofrimentos sao uma ajuda no nosso caminho a Unidade, eles sao os que eliminam, pouco a pouco os egos. Tentam mostrar-nos que o ego nao existe, e sendo assim o proprio sofrimento nao existe. Por que sofrer por algo irreal?

Falar de Maia me leva a uma outra filosofia. Maia e considerada a ilusao. E ao mesmo tempo e tambem a Mae Divina, a Energia Criadora. Parece ser uma contradicao. Pois hoje, meditando, olhando as aguas verdes do Ganges, cheguei a conclusao que nao e. Maia e a expressao do amor divino. E a forma que temos de ve-lo em nossa cegueira a realidade. Maia e a ilusao criadora, e mais uma taboa na ponte que nos leva de volta a nossa origem, a Unidade, e o caminho para chegar a Deus. A criacao nao existe sem Deus, mas me pergunto se Deus existiria sem a criacao. Como poderia existir um Deus inexpresso? Maia faz parte de Deus e Deus faz parte de Maia, sao complementarios e sao um so.

P.S.:Peco desculpas aos possiveis leitores pelos erros de acentuacao e portugues que possam haver. Quanto a acentuacao, nao sei onde estao as teclas nesses teclados da India. Quanto aos de portugues, muito tempo longe da patria nos leva a isso.

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Ah, Rishikesh... Ontem alugamos motos e fomos dar umas voltas. Eu, claro, atras, porque dirigir moto, ainda mais na India, ainda mais pela esquerda, ah, impossivel! Assim, sem querer fomos parar num longinquo templo de Shiva. Eramos as unicas tres estrangeiras do local. Um templo de peregrinacao totalmente hindu. Um espetaculo de cultura. O lugar em si nem e tao lindo, mas o caminho para chegar la, esse sim imperdivel. Parece ser que o templo foi edificado no lugar onde Shiva teria sido picado por uma serpente, o que originou sua cor azul.

Na volta paramos em uma prainha a beira do Ganges, tempo suficiente para dar um mergulho nas aguas verdes (bom, eu nao entrei, ainda um pouco gripada) e ver um lindissimo por do sol. E realmente muito interessante ver esse rio tao limpo e pensar no quanto muda daqui a Varanasi. Por os pes nessa mesma agua, em Varanasi, seria algo totalmente impensado para mim, apesar que conheco algumas pessoas que chegaram a beber da agua de la e nao aconteceu nada.

Hoje acordamos super cedo para tentarmos nos inscrever num curso de Yoga de 1 semana com um super professora suica. Bom, mesmo tendo chegado cedo, o curso ja estava completo. O que foi uma sorte! Pois na volta descobrimos que hoje mesmo comeca um festival de musica e yoga. Totalmente gratuito. Programacao por 2 semanas, todo o dia. Aulas de yoga, teoria da ayurveda, meditacao, 5 pilares da Sadhana, enfim, um senfim de coisas interessantes. Algo que em qualquer lugar no ocidente seria uma fortuuuuuna. Algo somente possivel na India mesmo. E ainda pela noite, para fechar, musica ao vivo!

Em Rishikesh qualquer um se sente artista de cinema. La esta voce caminhando tranquilamente e de repente voce se ve rodeado, 10, 20, 30 pessoas. Todas tirando foto de voce, com voce, querendo te tocar. No comeco eu nao tirava nao, agora so rio, eu tambem gosto de tirar fotos deles. Uma mao lava a outra.

Enfim, me espera uma semana de praticas e aulas, quem sabe nao serei uma yogui quando saia de Rishikesh?!

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Depois de longas 12 horas de viagem, finalmente chegamos a Rishikesh. Deixa eu contar algo sobre o que e viajar de onibus na India...Pense no que seria entrar em um liquidificar e talvez consigar imaginar o que e. Parece ser que os freios so funcionam em horas pre-determinadas, nao consigo achar outra explicacao. A velocidade e constante, vai buraco, vem buraco, desvia de carros, gente e vacas, nao interessa, o freio nao e usado. E la vai voce sacudindo, sem parar, nada de suspensao a ar ou coisas do genero. E pra quebrar a coluna de qualquer um. E mesmo viajando a noite, dormir que e bom, muito dificil.

E ainda por cima Dharamshala tem um unico defeito. O chegar e o ir embora. Pensem que e uma cidade no meio das montanhas, la no alto. Quase a Serra de Petropolis, curvas e mais curvas em alta velocidade. E la vai voce, olhos fechados e mao no estomago: Vomito? Nao, agora nao.. Ih, acho que agora vai! Nao, acaba que nao... E assim por diante. A primeira parada e chegar ao paraiso. Terra firme e ate janta sendo oferecida. Mas quem, em sa consciencia, consegue jantar com o estomago tao embrulhado?

Algumas horas de viagem e mais um pit stop para usar o banheiro. E algumas outras horas e voce nao ve a hora de parar de novo para voltar a fazer xixi (te digo, isso de sacudir muito faz as aguas do corpo baixarem). E nada de parar. Voce ja ta quase gritando, para pelo amor de Deus, e nada. Ah, enfim, uma parada. No meio do nada, alguem vai descer. Escuta, pergunto eu, olhando em volta, nao tem banheiro por aqui nao? Nao, respondem. E vai ter alguma outra parada para usar o banheiro, volto a perguntar. Tem nao. Ah, o matinho e uma otima opcao. E sai todo mundo do onibus (pelo menos nao sou a unica) e o matinho escondido vira um banheiro femenino ao ar livre.

Tres horas mais e chegamos a Rishikesh. Ver o Ganges limpinho ja vale a pena todo o sacrifiio da viagem. Aguas verdinhas e calor para compensar o frio passado no onibus (me salvou meu cobertorzinho tibetano). Largamos as mochilas em um hotel que nao gostamos e vamos em busca de algum lugar melhor. Preferencialmente um ashram. Depois de muito andar encontramos um, que seria legal se nao quisessemos fazer mais nada alem da yoga, porque tem um schedule fixo e tres comidas incluidas. Mas, honestamente, queremos passear, comer fora, sei la. Procuramos mais. Vamos ate a proxima ponte, ali, com calor, sentamos na beira do Ganges e colocamos os pes dentro. Ate vi peixes saltando. No final resolvemos ficar num hotel pequenino e voltar a procurar um ashram com mais calma e menos cansadas.

Ao entardecer fomos a uma Puja (como um ritual de oferendas) ao rio Ganges. Um montao de gente reunida cantando mantras e oferecendo velas e flores ao rio. Um espetaculo. Ao mesmo tempo e na frente, um casamento. Os mantras da Puja e a musica do casamento lutando entre si para serem escutados. No casamento todos muito bem vestidos. Ate fogos de artificio. Claro que ficamos ate bem depois de terminada a Puja na expectativa de ver a noiva. Afinal, aquele nao era um casamento qualquer. La estavamos nos, ainda esperando ate que uma se da conta que no lugar da noiva ha uma estatua. Espantadas perguntamos a alguem se aquilo nao e um casamento. Um casamento com Deus, respondem. Mais espantadas ainda ficamos, imaginando um homem casando com uma estatua e fazendo toda uma comemoracao para anunciar. Nao aguentando mais de curiosidade chegamos perto. E no lugar do noivo, uma outra estatua. Voltamos a perguntar. Um casamento entre os deuses, explicam, o casamento entre Krishna e Radha. Um casamento entre estatuas! Enfim...coisas da India!

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Bom, ultimo dia em Dharamshala. Ate meio estranho pensar em ir embora. Um mes aqui e ainda poderia ficar mais, tranquilamente. Tanto para se aprender! E muito facil se apegar a essa cidadezinha tibetana. Mas hoje mesmo pego o onibus noturno para Rishkesh. Pelo menos uma semana de aulas de yoga me espera por la. E quem sabe algum outro curso terapeutico...

Fora um lindo Ganges, um clima nao tao frio...E bom, alguma hora a India tinha que comecar. Porque Dharamshala nao e India. E Tibet na India. E muito mais facil, quase ferias mesmo. Ninguem te enchendo de perguntas, muito mais sorrisos. E ainda tem os Himalayas. Algo a repeito dessas montanhas. E incrivel como tem algo de poder nelas. Parecem destacar-se no ceu azul. Quase tem vida proprias, as vezes ate parecem respirar. Fora outra coisa. Parece ser que nos lugares de força sempre existem aguias. Pois aqui o que nao falta sao aguias. Sempre ha uma, ou duas, ou tres sobrevoando nossas cabecas. E corvos.

Ontem foi a ultima aula de massagem, ganhei outro lindo diploma. Ainda mais bonito que o de culinaria. E depois ainda fiz uma aula de Balancing Body, uma antiga tecnica tibetana que equilibra a energia e os elementos do corpo. Uma delicia. Sei de gente que vai adorar e ainda ajuda a equilibrar a temperatura do corpo (principalmente das pessoas que sempre tem pes e maos frios).

Quando fui fazer o check out da Guest House tive um pequeno problema. Quando entrei entedi que me cobrariam 200 rupias por dia. Pois hoje, na hora de pagar querem me cobrar 300 por dia. O cara comeca a gritar comigo. Enfim, sai pagando o que tinham me dito. Mas claro, fico com aquela sensacao de algo mal terminado. Assim que umas duas horas depois volto a Guest House, entendendo que provavelmente houve um mal entendido e ponho 250 rupias a mais. E me sinto melhor, porque converso mais calmamente com o recepcionista e ele ja nao grita comigo.

Em janeiro havera um Kumba Mela em Rishikesh. Uma palavrinha sobre o que e O Kumba Mela. Uma peregrinagem que acontece mais ou menos 1 vez a cada 3 anos. Milhoes de sadhus e gurus de toda a India se reunem em um mesmo lugar. Muitos deles deixaram tudo para tras e vivem em cavernas. Depois de 12 anos se faz o Maha Kumba Mela, que e a maior reuniao de pessoas com proposito religioso em todo o mundo.

Eu ja o sabia antes de vir pra India, mas tinha feito outros planos. Mas claro, na India nao se pode planejar muita coisa... Ela meio que te leva para onde voce deve ir. Pois ja comeca a passar pela minha cabeca nao ir para o sul depois do Nepal e sim ir para o Kumba Mela. Afinal quantas vezes na vida se pode ver tantas pessoas dedicadas a Deus (e tantos impostores, claro) em um mesmo lugar! O sul poderia ficar para depois...Ate porque entao daria tempo de fazer algum voluntariado no Nepal. Ai, ai, nada como viajar pela India. Desapego e a palavra para definir.

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Mais um entrada rapida...Hoje, mais um lindo dia de sol, feriado tibetano em Dharamshala. Fui com duas amigas a comemoracao dos 49 anos da inauguracao da TIbetan Childrens Village, a melhor escola tibetana de toda a India, e a primeira foi fundada aqui.

Saimos cedo, uma linda caminhada, lindas fotos com os Himalaias no fundo. Chegamos a tempo de um discurso em tibetano de uma hora e meia que nao pudemos entender, claro. E finalmente a aprensentacao dos alunos dancando. Bom, eu perdi uma parte, porque depois de uma hora e meia de discurso no sol precisei encontrar um banheiro, e claro, Lei de Murphy, no momento em que sai as apresentacoes comecaram.

Quando terminou ja era hora do almoco e descobrimos um lindo salao com um quantidade enorme de comida gratis. Entramos todas e comemos ate nos fartar, achando tudo aquilo muito estranho, mas enfim... Bom, quando terminamos e saimos encontramos um amigo americano e descobrimos que aquela era a area VIP, so para convidados. Ou seja, fomos de penetra, e valeu cada segundo.

Sentamos a meia sombra de uma frondosa arvore, cercadas de tibetanos e mais tibetanos e pudemos apreciar os bailes e cantos tipicos das diversas regioes do Tibet. Devo dizer que foi lindo. E que os tibetanos sao lindos. Cada um deles, ate os desdentados.

Algo interessante para se pensar. A India permitiu que os tibetanos se instalassem aqui. Abriu as portas para todos os refugiados do Tibet, todos que quiseram vir, sem excecao. Acho que nenhum outro pais jamais fez isso. Abrir as portas assim para outra cultura. E os tibetanos o agradecem. De verdade. Alem da bandeira do Tibet e da bandeira da India, uma outra bandeira, logo atras do palco com letras bem grandes: Thank you India!

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Hoje faco uma entrada rapida. Por onde comeco? Finalmente consegui mudar de Guest House. Para uma sem aranhas e sem gente estranha. A ultima apelidei de Crrepy Guest House. A nova se chama Freedom Palace. E embora nao tenha televisao tem uma linda maravilhora vista do nascer do sol. Um comentario sobre o nascer e o por do sol na India. Nada parecido com os do Brasil. Nada de ceu pintado de milhares de inumeraveis cores. Nada, apenas uma bola de fogo saindo num ceu azul. Nao que seja feio, claro, porque um nascer do sol feio e quase impossivel.

Ontem fui dar um passeio pelas montanhas com uma amiga. 3 horas de caminhada intensa, uma subida espantosa, vistas incriveis, ate chegar ao topo da montanha. Um lindo dia de sol (estou ate morena!! Na verdade, queimada, mas enfim...). No topo um pequeno lugar para relaxar e tomar um chai enquanto se aprecia a vista. E fazer aulas de frances. Sim, porque estou aprendendo frances e ensinando portugues. Nao e otimo poder viajar e aprender? Unir o util ao agradavel? Ficamos la em cima, com o ar puro e fresco por algumas horas e entao tomamos coragem e enfrentamos as 3 horas do caminho de volta. Por sorte um lindo caminho embora eu morresse de vontade de ir ao banheiro em pelo menos metade dele. Ate teria entrado um pouco na natureza, mas sempre tinha gente passando e nao me pareceu uma otima ideia correr o risco. Sei que hoje alem de queimada tenho uma gigantesca bolha no meu dedao direito. Parece que meu nike nao e resistente a India.

Hoje tambem foi mais um dia de ensinamentos do Dalai Lama. Exceto que hoje ele falou em ingles. Estavamos super contentes que nao precisariamos do radinho, nada de transmissao, simplesmente a voz dele no alto falante. E, felicidade parece nao durar muito, nem mesmo na India. Ao nosso lado havia uma tradutora russa. E a gente ja sabe como sao os russos, nao particularmente discretos. Me pergunto como o Dalai Lama nao a ouviu la do outro recinto. Tivemos que ligar o radinho de novo e buscar a transmissao dele para conseguir entender algo. So posso descreve-lo de uma maneira: fofo. Ele e um amor, a voz emana amor, ele emana carinho e docura. O vejo e me arrepio inteira, meus olhos se enchem de agua. Assim por nada, por meio minuto ao ve-lo subindo e descendo as escadas. Enfim, abaixo escrevo um pouco mais do que pude anotar dos ensinamentos:

A principal causa do sofrimento humano e a ignorancia. Alem disso estao a acao e a motivacao. A motivacao e o principal causador de acoes tanto fisicas quanto mentais. Segundo o budismo o conhecimento e a sabedoria sao as melhores maneiras de combater a ignoranca. Nao basta so ter fe, tem que por em pratica no dia-a-dia tudo aquilo que se aprende. BUdha ensina o caminho, mas cabe a cada um a responsabilidade e o esforco de segui-lo.

Porque temos um sentido do "eu" experimentamos dor, sofrimento e prazer. A experiencia mental e mais forte que a experiencia fisica. E possivel "overdue" o sofrimento no plano fisico com a devida atitude mental, porem e impossivel "subdue" o sofrimento mental com o conforto fisico.

Quando desenvolvemos "Awareness" consegue-se, pouco a pouco, eliminar as causas do sofrimento. Porque nao ha mais identificacao. Eliminando o sofrimento se chega a "Ultimate Reality".

Quanto mais compaixao temos, menos pensamentos e acoes negativos. Existem 3 motivos para nao cometermos acoes negativas: um e o medo da lei que nos punira, outro e o medo das consequencias que teremos que pagar por nossas acoes e o terceiro e a compaixao. Se amamos aos outros como as nos mesmos, nao cometeremos acoes negativas porque estariamos nos auto ferindo.

The Right Will is a solid base.

Bom, isso foi o que consegui anotar. Depois dos ensinamentos fui a minha primeira aula de massagem tibetana. Senti ate vontade de voltar ja pra casa para colocar em pratica. Mas, nossa, que exercicio viu? A forca, a concentracao, e eu suava. Iss porque nem da tempo de praticar tanto assim! Enfim, descobri que adoro massagens e adoro a India. Terei mais um diploma para a minha nova colecao!

Um ultimo comentario antes de me despedir. Viajar para a India aprece ser um eterno processo de desapego para uma mulher viajando sozinha. So ao vir voce ja esta abrindo mao do conforto, da seguranca e muitas vezes do respeito. E ao nao criar novos apegos/expectativas os antigos vao surgindo e sendo eliminados naturalmente. A India em si e um eterno trabalho de limpeza interna (em todos os sentidos), de aceitacao, de entrega e de fe. Por isso mexe tanto. Aqui parece ser o unic lugar do mundo onde levam 1 hora para trazer a comida errada e voce ainda sai sorrindo e agradecendo. O unico lugar onde encontrar cabelo na comida e algo perfeitamente natural.

Por primeira vez em muito tempo sinto que nao tenho que provar nada para ninguem. Nem para mim mesma. Estou aqui porque quero estar. Posso ir embora quando quiser e a viajem ja tera valido a pena. Me sinto feliz. Realizada. Viajando sozinha, mas nao so. Conhecendo gente. Conhecendo a mim mesma. Pelo menos um pouco mais.

E pouco a pouco vou entendendo, ainda que no plano mental, que cada pessoa que passa na nossa vida tem um papel a cumprir em relacao ao nosso karma. E nos provavelmente tambem teremos um papel a desempenhar na vida delas. Assim que os papeis sao cumpridos essas pessoas se vao, abrindo caminho para os que vem atras. Mas nos nos apegamos aos papeis. As pessoas que estao de passagem. Nos apegamos a uma imagem, a um "eu" que nao existe e estagnamos nosso proprio crescimento espiritual. Porque cada pessoa tem uma mensagem a entregar. Algumas podem levar anos para faze-lo, outras apenas algumas horas ou alguns dias. Mas nao queremos deixa-las ir, nao queremos seguir nosso caminho e nao deixamos que elas sigam os delas. Assim sao os apegos.

Nada que a India nao nos ensine.

India, incrivel India!

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Dificil acreditar que nao faz nem um mes que estou aqui. Tantas coisas, tanta gente passando pela minha viagem que um mes parece ser infinitamente pouco.

Por exemplo, em apenas 3 dias conswgui um lindo diploma. Agora sou diplomada em culinaria tibetana. Nao paro de comer! Ja sei fazer paes, sopas e momos (uma especie de pastel cozido ao vapor). E nao e um diploma qualquer nao, nada de folha sulfit, diploma quase de verdade!

Um pouco de aventuras... Estava eu la, linda e formosa no outro dia, tomando um maravilhoso banho quente no banheiro do meu quarto, olho pra cima e...a maior aranha que ja vi na minha vida (isso porque ja vi algumas) la, me encarando. Ahhh, minha primeira reacao foi sair correndo e gritando, de shampoo na cabeca, mas logo me dei conta que essa ideia, na India, nao seria naaaada bem recebida, assim que quase calmamente terminei meu banho, congelando a aranha marrom, peluda e de pernas compridas com meu olhar e sai para buscar alguem que pudesse tira-la de la. Passaram uns 10 minutos antes que eu conseguisse encontrar o recepcionista. Expliquei minha historia e la vai o cara, desaparece por uns 5 minutos em algum lugar e volta com um aromatizador. Nao, volto a explicar, tem uma aranha enoooooorme no meu banheiro! Ah, ele disse, spiderman! Nao, quase grito! So spider, sem man!!! Ah, finalmente eu, de cabelos pingando, consigo arrastar o cara pro meu banheiro. La vai ele, olha com cara de entendedor e diz, nao tem problema! Voce tire esta aranha dai agoraaaaa, quase grito de novo! Finalmente me vejo livre da aranha e ainda faco o cara dar uma checada em todo o resto pra ver se tem nenhuma outra. Isso porque e o terceiro dia que estou la e manhtenho sempre mantenho a porta do banheiro fechada. Isso quer dizer que ela sempre esteve la. Embora nao a tenha visto. Prefiro nem pensar onde.

Por outro lado chegou o Dalai Lama. Num lindo dia de sol, as ruas todas enfeitadas, um mar de gente amontoada para ve-lo. Bom, aqueles que chegaram primeiro talvez tenham podido, mas eu so pude ver a caravana, ja que ele estava sentado no menor carro.

E ontem comecaram os ensinamentos. Seguranca maxima. Nada de cameras, telefones, armas, nada. So ve-lo entrar, com um sorriso manso no rosto e emanando uma aura de bondade ja valeu a pena. Bom, pelo menos isso salvou o primeiro dia. Ate porque a traducao nao e simultanea e nao e das melhores. A transmissao e feita por radio e as vezes o sinal nao e muito bom. E o tradutor, as vezes le na mesma velocidade que o Dalai Lama, os textos sagrados, que aqui ja sao conhecidos e nao pra entender nem uma palavra.

Hoje, ja fui mais preparada. Papel e caneta na mao. Anotar ajuda a concentrar a mente, alem de ajudar a entender. Por outro lado ontem comprei um tappawere para servir de prato ja que la mesmo servem comida. Ontem, ao nao saber, sai com 3 amigas para almocar e a comida demorou tanto que quando conseguimos voltar ja tinha comecado. Apos muita luta consegui uma porcao de arroz e uma de sopa que me fizeram bastante feliz. E de novo ve-lo entrar e sair me encheu os olhos de lagrimas e me arrepiou o corpo inteiro.

A verdade e que muitas coisas nao consigo entender. Nem eu nem ninguem, imagino. Mas suponho tambem que muitas coisas entrarao por osmose. Nao e todo dia que podemos estar perto (nao no mesmo recinto) de um ser desses.

Hoje consegui tomar algo de notas. O tema foi a nao existencia do eu (selfness). O budismo e o pacificar a mente. A mente, segundo eles, pode ser pacificada atraves da meditacao sobre a nao existencia do eu. Quando a mente deixa de ser egoista (self-centered) passa a ser compassiva e nao gasta tanto tempo pensando em si mesma. Budismo e o cultivo da mente nao egoista.

Quando um pessoa deixa de pensar tanto em si mesma o "eu" deixa de existir e amente se acalma.

Quanto a generosidade, o budismo perga que devemos ser generosos sem apegos ao objeto dado, generosos simplesmente pelo ato de se-lo, sem pensar no que recebera em retorno. Generosidade + amor + compreensao levam a iluminacao.

Um objeto pode ser visto de duas formas: superficial, onde se ve a forma resplandecente e a analitica, onde o objeto nao existe de maneira independente. Esta 'e a "Ultimate Truth". O "eu" deixa de existir, nao pode ser encontrado, nem identificado. O que reconhecemos como "eu" e nada mais que uma forma fisica e uma personalidade criada em cada vida.

Ate mesmo os Bodhistwas devem ser vistos como nao-existentes ja que suas existencias nao ocorrem de forma independente. E impossivel ter compreensao do ser se nao se compreende a nao existencia do eu e da forma (phenomn). Por outro lado deve-se ter cuidado para nao se apegar a sensacao de inexistencia.

Para provar a existencia real de um objeto, este deveria passar por 3 analises.
-O objeto deve ser aceito por uma mente convencional
-O objeto nao deve ser rejeitado por uma mente que analisa o sentido convencional
-O objeto nao deve ser rejeitado por uma mente que analisa o "Ultimate Sense"

Nao e que nada existe, as coisas simplesmente existem por sugestao subjetiva. Ainda que uma mente esteja livre de arrogancia, se nao se tem conhecimento nao se chegara aos resultados devidos.

O corpo, por exemplo, so e reconhecido como corpo por todas suas diferentes partes. Ha uma co dependencia entre todas as partes e o corpo como um todo para que podamos reconhece-lo. Isso demonstra que o corpo nao e real, ja que sua existencia nao e independente.

Objeto+ sense of self = apego ou aversao. Para evitar os dois ultimos tem-se que minar tanto o sentido do eu quanto a visao que uma pessoa tem de um objeto. O entendimento da origem dependente (dependent origination) mina a ignorancia. Na existencia dependente nao ha forma real.

Para que a mente possa ser controlada deve-se ir alem do sofrimento. Ate que um ser passe por isso nao pode ser chamado Bodhisatwa. Meditar sobre a nao existencia (emptiness) ajuda a percorrer o caminho da iluminacao, ja que mina o sentido do "eu"

Bom, isso foi o que consegui anotar de todos os ensinamentos de hoje. Que todos facam proveito. Be Happy!

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

De volta a terra. 10 dias de silencio. 10 dias sozinha com o maior inimigo do homem, sua propria mente. 10 intensos dias e 10 fantasticos dias.

O primeiro dia e dificil, controlar a mente, mas como tudo e novo, voce se esforca mais. No segundo dia a mente comeca a se dar conta do que voce esta fazendo e vem pra cima. No terceiro dia eu e perguntava o que tinha passado na minha mente pra fazer um vipassana de novo. E no quarto dia quando voce tem que ficar imovel, nossa, ai sim voce quer fugir. Mas pouco a pouco a mente comeca a acalmar. Pouco a pouco o silencio, ainda que nao completo vai chegando. A respiracao ficando cada vez mais imperceptivel. As dores vao passando e voce lembra porque esta ali.

Sonhei. Sonhei muito. Muitas aguas passadas foram reviradas durante os sonhos. Isso porque estou acostumada a sonhar. Quem me conhece sabe. Nao faltam historias nos meus sonhos. Mas durante o Vipassana duplicaram em quantidade e intensidade. Simplesmente incrivel. Limpeza total de corpo e alma.

Acordei duas noites seguidas com um subito clarao no meu rosto. Olhei assustada e vi pela janela do teto uma incrivel lua cheia iluminando meus sonhos. Nao e todo dia que podemos ver a lua cheia desde a cama. Abri os olhos, sonolenta, vi a lua, apreciei por uns segundos, vierei de lado e pensei, volte a dormir que voce tem que acordar as 04:00!

Me sinto caminhando em ondas. Literalmente. Ligeiramente enjoada, como estar em alto mar. Voltar a vida real foi dificil. Ainda mais porque como o Dalai Lama esta vindo os hoteis estao todos cheios. E os precos dobraram. Um novo teste de equanimidade pos Vipassana.

Ah, mas o Vipassana tem muitas vantagens alem da meditacao. Por exemplo, fortalece as pernas. Isso de ficar fazendo as necessidades agachada, ufa, cansa. Dai descobri uma utilidade para a sempre presente torneirinha que os indianos usam para lavar as maos. E nao, nao e lavar as minhas maos, ja que os banheiros tem pia para isso. Nao, para dar apoio. Assim voce agacha, mas tem onde se segurar.

Alem disso o Vipassana, para quem ja fez pelo menos um curso anterior emagrece. Sim, porque tomamos cafe da manha (as 06:30 da manha) e almocamos (as 11:00) e nada mais. Bom, mentira, as 17:00 podemos tomar cha de limao. A verdade e que nao fiquei com fome. Meditar nao gasta muitas calorias. E no decimo dia sim podemos comer a noite. E foi o que fiz. Comi. E passei a pior noite de todas. Nao conseguia dormir. E quando finalmente conseguir, passei a noite tendo pesadelos. A comida pesa e nao nos damos conta.

Parece que realmente nao tenho muita sorte com os chuveiros nos vipassanas. Quem leu a entrada do primeiro Vipassana que fiz, sabe. So no ultimo banho consegui agua quente. Pois dessa vez fiquei toda feliz porque ganhei um quarto com banheiro. Chuveiro, pia e privada na chao. Mais feliz ainda quando consegui meu primero banho quente no primeiro dia. Entao, no segundo dia la fui eu toda contente tomar banho e pronto, agua gelada. Bom, muita coragem nessa hora. Terceiro dia, la vou eu de novo. E agua gelada! Cabelo pra frente e banho em duas partes. Cabelo e corpo, separadamente. Durante o almoco escrevi uma pequena nota para a manager explicando que nao tinha agua quente. Durante a noite me comentou que estava consertado. No dia seguinte la vou eu e entro em extase ao conseguir agua quente. Dia seguinte... Agua gelada de novo. Bom, decido, para nao desperdicar mais palavras, tomarei banho nos chuveiros compartilhados do lado de fora. NO luck. Agua fria. O problema e comigo mesmo porque depois, conversando com as outras mulheres descobri que todas sempre conseguiam agua quente...

No sexto dia choveu desesperadamente. Pedrinhas de gelo. Pude ve-las caindo desde a janela do banheiro. Nao chegou a ficar tudo branco como no Matutu, mas foi suficiente. A noite mais fria de todas. No dia seguinte, as 04:30 da manha, descobri ser impossivel meditar. Mesmo com meu cobertorzinho tibetano, tiritava. Mas ao amanhecer, olhei para o horizonte e vi a primeira montanha nevada. Valeu a pena todo o frio.


Vivemos num mundo de sensacoes. Sensacoes que tentam nos distrair do nosso verdadeiro eu. O homem em geral se sente vazio e tenta encontrar a felicidade em coisas materiais. Hoje quer um telefone, amanha um ipod, depois uma moto, carro, casa tv, tv maior, computador. Um querer sem fim. Um querer que nao preenche. O homem se preenche a si mesmo. Ou pelo menos deveria. O homem deveria saber fechar os olhos para tantas sensacoes superficiais e conhecer aquilo que verdadeiramente sente. Dentro. E entao se sentiria completo. E seria feliz. Em todos os momentos. Nao somente naqueles onde tudo sai conforme o esperado. Nao. Em cada momento, em cada minuto, segundo, porque viveria no agora.

No decimo dia podemos voltar a falar. Se diz que e para a volta ao mundo nao ser tao impactante. E e um momento lindo. Todos querem compartilhar felicidade. Querem saber como estao aquelas pessoas com quem conviveram por 10 dias, que ouviram chorar, mas nem olhar puderam. E ali, no decimo dia, existe tal felicidade no ar, os rostos brilhantes e sorridentes. Cada um sabendo que enfrentou seu pior inimigo por 10 dias e saiu ileso. Um momento magico.

Pois foi durante esse momento magico que conheci uma menina suica. Mais uma daquelas que voce olha e pensa ja conhecer de algum outro lugar. Bom, provavelmente uniremos as mochilas. Planejo ficar em Dharamshala por mais uma semana mais ou menos para escutar os ensinamentos do Dalai Lama. Depois vamos juntas para Risshkesh e de la para o Nepal! E se possivel, do Nepal, fazer um tour para o Tibet.

Viajar e assim. Conhecer gente, compartilhar momentos, caminhos se juntam e se separam incessantemente. Portas se abrem no mundo inteiro. Nao existe solidao. Nao existe tristeza. Existe sim sempre a duvida do amanha.

quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Do lado da Guest House tem um centro tibetano onde aceitam voluntarios. Um tipo facil de voluntariado. Falar ingles com refugiados tibetanos. Pois fui la e sentei com uma monja que me contou um pouco de sua historia. Muita coisa nao consegui entender por causa do forte sotaque. Mas o pouco que entendi foi o suficiente.

Estamos sempre falando do Holocausto. Para nao esquecermos. Para nao cometermos o mesmo erro. Pois digo que coisas parecidas estao acontecendo e nos tempos atuais e uma vergonha que nao se faca nada.

Esta mulher foi criada numa fazenda. So teve acesso a escola aos 24 anos. Aos 19 resolveu ser monja. Agora tem 37 e e uma refugiada politica. A tiraram de seu monasterio, junto com todas as outras monjas e a jogaram numa prisao chinesa por 3 anos. Durante esses 3 anos foi torturada (suspensa pelos punhos, eletrocutada e sabe-se la mais o que) e forcada a trabalhar. Tinha um pedaco de terra onde plantava. Tudo o que colhiam era escrupulosamente pesado e se nao chegasse ao peso esperado era severamente punida.

Depois de 3 anos finalmente a liberaram, com uma carta para apresentar-se de tanto em tanto tempo em Lhasa. Perdeu a todos seus amigos, presos, espalhados pela China e pelo Tibet, sem acesso a telefone, internet, sem conseguir saber onde estao. A mandaram de volta ao povoado onde nasceu. Ai pelo menos tinha uma amiga que morava no povoado vizinho, tambem monja saida da prisao. Para encontrar-se levavam as ovelhas a montanha que ficava no meio dos dois povoados e se encontravam no topo.

POis foi nesse cume que decidiram que nao queriam mais ficar ali. Cada uma apresentou-se em Lhasa em dias diferentes, segundo o indicado nas cartas dadas pela guarda chinesa. Ali juntaram-se a outras 17 pessoas e juntas escaparam.

Levaram 28 dias caminhando pelas montanhas, cada um com apenas uma bolsa, com um par extra de sapatos e um cobertor. 26 dias ate escutar um onibus. 28 dias para encontrar ajuda. Durante esses 26 dias so caminharam, ja nao consegue contar quantas montanhas subiram e desceram.

Para passar na super controlada fronteira com o Nepal tiveram que caminhar pela noite. Sem luz, sem barulho, sem ver a pessoa da frente, as vezes conseguindo escutar o ruido de um passo.

Ja no Nepal encontraram pequenos e pobres povoados onde conseguiram trocar os casacos por pouca comida. Ali erao tao pobres que nao podiam trocar mais e eles tinham fome e sede e sono, qualquer coisa servia. Tambem no Nepal foram roubados, separados do pouco que tinham. Levaram os sapatos, os cobertores, ate as poucas moedas costuradas no interior da roupa.

Depois de 28 dias escutaram ruidos de onibus. Depois de 28 dias encontraram mais refugiados tibetanos. Refugiados chegados a mais tempo. Lhes deram comida e abrigo. E o mais importante, uma passagem para Delhi. E de Delhi para Dharamshala. Onde encontraram finalmente seguranca. Queria poder dizer que encontraram tambem paz, mas nao posso ao ver as lagrimas que a monja contem ao contar a historia. Quanto ficaram para tras? Quantos nao sobreviveram a prisao chinesa? E as lembrancas? E os pesadelos?

E nos seguimos falando do Holocausto...

Toda essa historia me fez pensar muito. Parece muito dificil mudar o mundo. Nao valorizamos o planeta, nao valorizamos os seres humanos. Mudar o mundo e impossivel se nao comecamos por nos mesmos. A acao de uma pessoa pode mudar/influenciar aqueles que estao a sua volta.

Comece por si mesmo. Pouco a pouco. Recicle o papel dos seus cadernos. Separe um fim de semana para isso. Tenha energia renovavel na sua casa. Se possivel plante sua comida. Ame a natureza. Medite. Sorria. Sorria para si mesmo. Sorria para os outros. De muitos abracos. De muito amor. Ajude a quem necessita, mesmo que voce nao tenha muito. Tire um dia para estar em silencio. Mude e estara mudando o mundo.

Faca que a sua casa seja um pequeno paraiso. Que outras pessoas possam te buscar para receber alivio. Nao precisa ser um iluminado para fazer o bem. Nao espere a sabedoria da idade antes de modificar sua vida. Mude pequenos gestos e atitudes.

Veja somente filmes bonitos, filmes que a alma agradeca. Sente em frente a uma mesma janela por horas ate apreciar a beleza que esta do outro lado. Se olhe no espelho ate encontrar a beleza que esta em voce.

Brinque com uma crianca. Ajude a um idoso. Ofereca o ombro a um amigo. Plante algum vegetal. Coma o vegetal que plantou. Plante uma flor. Aprecie a flor quando crescer e tambem quando murchar. Viaje. Enfrente seus medos. Nao tenha medo.

Ande descalco. Deite embaixo de uma arvore. Feche os olhos e voe. Aprenda a cozinhar. Para os outros. Busque ter um pedaco de terra. Nao dependa da tecnologia. Aprecie a tecnologia. Desligue as luzes. Passe uma noite a luz de velas. Passe duas noites a luz de velas. Acenda as luzes so quando necessario. Tenha luz solar. Nao tenha televisao. Tenha um computador.

Viva simples e felizmente. Nao queira comprar tudo o que ve. Compre so o basico. Tenha so o necessario. Nao queira depender da caridade dos outros. Aceite a bondade alheia. Ofereca caridade. Chore. Chore de felicidade. Chore de emocao. Chore de tristeza. Deixe a tristeza passar. Esqueca magoas e rancores. Lembre de momentos bonitos. Comparta momentos bonitos.

Diga "eu te amo". Todos os dias. Na frente do espelho. Aos amigos. A familia. Aos inimigos (se nao quiser, pense, um dia sera verdade). Escute boa musica. Evite o rock pesado. Influencia nossos pensamentos. Faca um retiro. Na sua casa. Em um ashram. Na floresta. Olhe as estrelas. Veja o nascer do sol. Pelo menos uma vez ao mes. Tome banho de chuva. Segure um bebe. Faca-o rir. Faca-o dormir.

Aprenda a ficar em silencio. Aprenda a ter so pensamentos positivos. Ame. A todos. Cuide do mundo. Veja novos horizontes. Faca coisas inesperadas. Surpreenda-se. Admire-se. Aprenda a ficar sozinho. Aprecia a companhia dos outro. Aprenda com seus proprios erros. Aprenda com o erro dos outros. Viva. Cada minuto. Cada segundo. Viva agora. aprenda tudo que puder. Nao aprenda nada que nao for usar. Nao fique rodando assuntos na cabeca. Passou. Esqueca. Use sua imaginacao. Seja criativo. Seja verdadeiro. Seja voce mesmo. Seja feliz. Deixe de inventar justificativas para nao se-lo. Nao deseje nada, mas aceite tudo que a vida te der.

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Ontem pela tarde tive que trocar de quarto para que correspondesse as meras 150 rupias que estou pagando. Fui parar na planta baixa, sem varanda, de costas para a vista. Mas um quarto limpo e amplo. Para que queixar-me. A gust house dispoe de um Roof Top incrivel e ter que sair do quarto para ver a paisagem so sera bom, verei mais gente.
Olhar a vida nas ruas de Dharamshla e todo um aprendizado. OS tibetanos sao os donos dos negocios. Os indianos trabalham para eles. Quem cozinha sao os indianos e nao os tibetanos. Por outro lado, os tibetanos nao pedem esmola, os indianos sim.Todos os restaurantes e lojas tem um pequeno altar dedicado ao Dalai Lama. As paredes pintadas no estilo tibetano, os tetos vermelhos e bandeirinhas penduradas.
A cidade esta imersa numa imensidao branca. Desde ontem. As rus banhadas pelas nuvens, o vale e os picos totalmente escondidos pela nevoa. Tudo parece mais silencioso. A vida parece mais concentrada, parece mais limpa, parece mais real. Como se todos esperassem a volta do sol.
Hoje finalmente consegui comer no restaurante sem nome, que afinal tem nome: Dhasang, nao me perguntem o que significa. As tres mesas estavam por primeira vez vazias, desde que cheguei. Os turistas nem entram, o unico menu disponivel esta colado na parede e escrito a mao. Nem agua mineral tem. Feito para os tibetanos e nada mais. Mas continua sendo a melhor comida de todas. E quando estava la, esperando meu Thukpa (sopa de macarrao e verduras) entrou e sentou comigo, porque as duas outras unicas mesas estab\vam ja ocupadas, um suico, Julian. Acaba de sair do Vipassana e concorda que ali e o lugar com a melhor comida e o mais barato tambem. Diz que fez o Vipassana por acaso e por sorte, porque estava no numero 35 da lista de espera. Isso fez meu coracao gelar. Onde ja se viu lista de espera para fazer Vipassana?
Subimos juntos ate quase chegar ao centro de meditacao, porque ele esta hospedado em Dharamkot, uma vilazinha acima de McLeod Ganj, que e onde estou ficando. No meio do caminho, do outro lado do vale, por primeira vez reparei numas escadas que subiam a montanha. Escadas ingremes, escadas infinitas. Escadas que se perdem nas nuvens brancas que cobrem as montanhas. "Stairs to heaven", diz Julian, e eu nao posso mais que concordar.
Sento numa venda, na porta do centro de meditacao a espera que abra. O chai nao e tao bom quanto se podia esperar depois de uma longa caminhada. As moscas borbulham aqui e acola. MOnges sentados observam desde os bancos verdes a frente, o mala girando incessantemente em suas maos. Cigarras cantam e a branquidao envolve ainda mais. "Lost in heaven", nao posso deixar de pensar.
O Vipassana que comeca no dia 1 de outubro esta cheio. Voce pode ir para Katmandu, dizem. Nao quero Katmandu, nao qeuro Rajastao, quero faze-lo aqui. LIgo para o numero que me dizem. Fico na lista de espera. Numero 17. Ah,99% de chance de conseguir fazer o curso. Muita gente se inscreve e nao aparece. Amem, penso. Mas decido, se nao consigo fazer o curso como estudante, faco como ajudante, por mais dificil que seja, ja que faz tanto tempo que nao pratico. E o que tiver que ser, sera, porque assim e a India, aqui eu nao controlo nada. Nem quero controlar. Deixo meu destino nas maos da vida, e tenho certeza que tudo que passar sera o melhor para mim.
Volto para uma cidade ainda imersa numa nuvem branca. Volto devagar, apreciando a paisagem, vendo os macacos rebuscando no lixo. Os corvos que cantam sem parar. O cheiro dos momos (especie de pastel cozido ao vapor) nas ruas. E as vacas que as vezes cruzam meu caminho. Me sinto segura. Me sinto feliz.

sábado, 26 de setembro de 2009

Depois de varias horas de espera consegui subir finalmente no onibus para Dharamshala. Varias horas porque tive que deixar o hotel as 13:00 e quando comprei a passagem me falaram que o onibus saia as 16:00. Bom cheguei na agencia as 15:30 porque de la tinham que me pevar para o ponto. Ai fui descobrir que o onibus so saia as 17:00 e ninguem viria me buscar ate as 16:00. Bom, o que e meia hora de espera, certo? Passa a meia hora, passa 1 hora e so entao alguem aparece. Chegamos no ponto as 16:45. Bom, nao e um ponto, e uma calcada e o onibus para ali e pronto. Bem, mas tudo na India atrasa e o onibus que deveria passar as 17:00 nao chegava. E comeca a dar vontade de ir no banheiro. Sorte minha que nao fui a unica. Me juntei a duas israelis e la fomos nos em busca de algum banheiro. Demos com um banheiro publico. Ja da porta o cheiro era tao forte que dava vontade de vomitar. A mais corajosa de nos perguntou a uma indiana que estava parada ali perto, que nos apontou umas portas. As portas eram casas. Com a maior cara perguntamos se nao nos deixavam usar o banheiro. Isso gerou uma pequena discussao, mas as portas no final foram abertas e os indianos ganharam a historia da vida ao deixar que tres estrangeiras usassem o banheiro. Quando voltamos ao "ponto", o onibus ja estava la com nossas coisas e todo mundo dentro, so nos esperando.
Assim comecaram as 12 longas horas de viagem a Dharamshala. O calor dentro do onibus era quase insuportavel Todas as janelas abertas e as caras para fora, como cachorros. Em algumas horas sentia meu rosto tao sujo e gosmento que temi que se quebrara como uma mascara com a proxima piscada.
Um comentario sobre pegar onibus na India. Pode ser algo muito complicado. Quando te vendem a passagem te dao um ticket, como em qualquer outro lugar. Certo, so que ao subir no onibus exigem que voce entregue esse ticket. O que nao teria problema se os indianos nao fizessem over booking normalmente. E claro, fica voce, dentro de um onibus sem um ticket que prove que voce pagou por aquele lugar, e sem o ticket eles podem te mover daqui para la como um peao, ate voce ir parar la no fundao (devo dizer que sacode demais!). Nos juntamos todos os estrangeiros numa complicacao geral para entregar tao valiosos papeizinhos. So o fizemos quando conseguimos a palavra e o cartao pessoal do responsavel da companhia e a promessa de que ninguem seria trocado de lugar.
Viajar de onibus na India, mesmo de madrugada, e toda uma historia. Nao ha um minuto de silencio. Buzinas incansaveis soam aqui e acola. E uma forma de saudacao e nao sera dificil ver algum caminhao com os dizeres "Horn please" ou "Blow the horn", deixando bastante clara a posicao dos indianos em relacao ao "suicidar-se" numa aventura pelas estradas indianas.
A vantagem de que o onibus tenha saido tarde e que quando chegamos a Dharamshala ja estava claro. Minha primeira intencao era ir a mesma guest house que fiquei da ultima vez que vim. Mas acabei compartilhando um rickshaw com um australiano e subindo ao proximo povoado, Bhagsu, porque supostamente e mais tranquilo. Bom, supostamente nao, me verdade que e mais tranquilo, mas apos ver alguns quartos e nao gostar peguei outro rickshaw e voltei para Dharamshala e a Pawan House, a guest house da ultima vez.
Ai tive a oportunidade de fazer minha grande primeira negociacao. Da ultima vez que vim paguei 150 num quarto duplo e o pessoal que conhecemos no onibus pagou 100 rupias nos de solteiro. Bom, queriam me cobrar 300 rupias no de solteiro. Ri e comentei que o preco tinha subido demais. Ah, mas subiram tambem os impostos, me disseram. Apos uma longa conversa consegui, sob promessa de nao contar a ninguem, que me cobrassem 150 rupias. Eram as 8 da manha. Tive que esperar ate as 12:30 para poder entrar. Mas valeu a pena chegar num quarto grande e limpo, com um banheiro decente, televisao e uma vista espetacular.
Que lindos sao os tibetanos, sempre com um sorriso nas bochechas rosadas. Sempre com um djapa mala na mao. No meio da rua se pode escutar mantras tocando e voce entra no clima, querendo ou nao, pois antes que perceba esta repetindo o mantra que escutou (geralmente OM Mani Padme Hum) na sua cabeca.
O dia amanheceu nublado. Uma neblina branca e baixa, nao se pode ver o topo das montanhas. Algumas casas coloridas se deixam entrever pela branca cortina, junto com as bandeirinhas tibetanas que bailam ao vento com milhares de pedidos e preces. O ceu ruge, os corvos cantam e um aguia paira no ar observando tudo desde cima.

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Bem, aqui estou eu, de novo na India. Demorei, mas voltei. E a India nao mudou nada. Continua sendo suja, com transito caotico, as buzinas incessantes e ainda por cima faz calor. Nada como a India.
Chegar as 23:00 horas nao foi tao ruim quanto havia imgaginado. PEgar taxi foi tranquilo, dificil foi reconhecer a rua do hotel na escuridao e com tudo fechado. Mas cheguei sa e salva num hotel de paredes amareladas e descascando, lencois sujos (sorte que tenho meu cobertorzinho tibetano) e banheiro que seria impossivel entrar em qualquer outra parte do mundo. Enfim, ate o quarto parecia o mesmo da outra vez, ate a televisao parecendo completamente fora de lugar muito embora eu tenha ficado em outro hotel. Dormir ja foi mais complicado. Nem por causa do calor, ja que o quarto tinha ate ventilador, acho que foi mesmo a ansiedade. Nao consigo contar nos dedos as vezes que virei e revirei na cama, ate desistir e cedinho descer por uma ruela cheia de moscas ate um cafe para tomar um lassi de banana que deixou muito a desejar.
E depois bater perna, porque todos ja sabem, vim sem roupa. Bom, nao e verdade, vim com a calca do corpo e algumas blusinhas. Algo tinha que comprar, mas em Delhi nem isso tenho vontade. Assim que depois de trocar dinheiro e pesquisar mercado acabei comprando a passagem para Dharamshala por modias 450 rupias (para os leigos, atualmente 1 euro vale 70 rupias), o que e extremamente caro tendo em conta que ha 4 anos paguei 300 (sim, trouxe meu caderninho de precos da vez passada). Mas ninguem me fez mais barato. Nem falando que sou israeli.
Sim, porque resolvi tirar vantagem do fato. Aos israelis sempre cobram mais barato, afinal sempre veem meio sem dinheiro. Assim que comecei a falar a quem me pergunta se seu de la. So dizem que meu sotaque de ingles nao parece muito, mas como ate os israelis falam que pareco... Melhor aproveitar!
Fora que no aviao quase mudo todo o pouco planejamento que tenho nessa viagem. Sentei ao lado de uma mulher indiana muto simpatica que ia para o templo de Krishna em Vrindavam. Me convidou para ir com ela. Quase fui, mas depois pensei que enquanto nao tiver meditado, ou melhor, aprendido a meditar, nao conseguirei tirar muito proveito.
Mas assim e quando a gente se abre para a vida. Os destino vai colocando as possibilidades no nosso caminho. cabe a nos decidir quais aceitar.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Conto de Cristina

Cristina tinha problemas no trabalho. Se sentia exausta, se sentia sem animo, sem expectativas. Sentava atrás da escrevaninha todos os dias, escrevendo cartas, traduzindo textos, atendendo telefones. Era eficiente, muito eficiente, fazia as coisas rápido, e sempre dava o melhor de si.
Quando tinha tempo olhava pela janela. Uma janela pequenina que ficava no fim do corredor. A janela tinha vista para os infindaveis telhados da cidade. As vezes deixava a vista se perder nos telhados, tentando se sentir como as telhas ao sol. Tentando absorver o sol só com a imaginaçao. Sentia inveja dos pássaros. Os via voando de um lado a outro, sentindo o vento passear em suas penas, vendo aquele imenso mundo lá do alto.
E entao tinha que voltar à sala congelada por um ar condicionado. Tinha que seguir olhando para a tela do computador. Nao podia voar, nao podia sentir o sol. Esperava ansiosamente pelo fim de semana, onde podia fingir que era uma telha e absorver todo o sol, nao só com a imaginaçao.
Sua mae costumava dizer que ela era uma alma livre. Que nascera para ser bicho selvagem. Que nascera para nao pentear nunca o cabelo, ate ter um ninho de pássaros nele. Desde pequena reclamava e chorava quando a mae insistia em desembaraçar seus cachos. Sua mae dizia que já tinha levado muitos sustos quando ela era pequena. Ficava horas sem fazer barulho algum. E nao adiantava chamar, ela nao respondia. A mae a encontrava onde houvesse um raio de sol. Deitada no chao. Grudada no vidro da janela. Sentada na cama. Ela nascera para ser um raio de sol.
As vezes perdia a noçao do tempo olhando as formigas, indo e vindo no chao num dia de chuva. Algo maligno dentro dela a fazia provocá-las algumas vezes. Punha um dedo no meio do caminho, ou esfregava-o com sabao. E ficaba horas observando a confusao daquela fila negra, sem saber para onde ir, sem cruzar aquele mínimo espaço, mesmo havendo outra do outro lado.
“Menina, dizia sua mae, acorda! Sai desse vento ou ele vai acabar te levando! Nunca vi menina assim!”
Mas ela queria que o vento a levasse, carregado-a para mais perto do sol. Ficava ali, mesmo com chuva, na esperança que um dia se compadecera dela, ou que achasse que ela era parte dele e finalmente a levasse flutuando pelo mundo afora, acima das nuvens.
Parecia que sua pele tinha se acostumado com a chuva. Era como se ela mesma pingasse. Ou como se absorvesse as gotas. Como uma árvore. Se sentia mais brilhante depois. E sentia vontade de cantar quando voltava o sol. Como os pássaros.
Ir à escola, foi um sacrificio, assim como terminar a faculdade. Era como ouvir vozes desentonadas, falando com o vazio. Ouvir todas as aulas de história, geografia, ou matemática, enquando o dia, o sol, a vida escorria lá fora, sem que ela pudesse fazer parte. O terminou por sua mae, que ainda acreditava que ela pudesse ser “gente”.
Agora já nao a tinha mais para dar-lhe bronca. Sua mae tinha morrido, de forma inesperada, em um dia chuvoso. Adormeceu pela noite e já nao despertou pela manha. Como se fosse uma decisao tomada anteriormente. Como se soubesse que já tinha cumprido sua missao.
Depois da morte de sua mae, Cristina resolveu dar um jeito na vida. Talvez a mae tivesse razao, ela tinha que parar de sonhar. Talvez a mae tivesse desistido de acordar assim como tinha desistido de falar que ela saísse do sol ou que penteasse os cabelos.
Lá foi Cristina, os cachos domados em um coque perfeito e lacado, vestida na sua melhor roupa, tentando equilibrar-se no salto, tentando fazer as pernas nao se atrapalharem dentro daquela saia tao apertada. Cristina nao tinha experiencia. Mas, sim, um currículo bonito, que aprendera a fazer em suas infindáveis aulas.
Teve que buscar muito. Ninguém queria uma empregada sem experiencia. Nao desistia e continuava buscando, porque afinal, enquanto caminhava de um lado a outro aproveitava o dia. Queria que ninguém a contratasse, queria ficar buscando para sempre, assim, a mae saberia que ela estava fazendo a sua parte e ela nao seria obrigada a estar em um escritório.
Mas afinal, alguém gostou de Cristina. Gostou daquele olhar meio perdido. Daquela cara tao séria numa menina tao jovem. Gostou da sinceridade e coerencia. E resolveu dar uma chance. E lá se foi Cristina, tristemente, para seu primeiro dia de trabalho. Já nao tinha mais que se equilibrar no salto, nem se concentrar para nao embaralhar as pernas na saia apertada. Tinha que usar óculos. Talvez por ter olhado para o sol por tanto tempo.
No escritorio, Cristina parecia a secretária perfeita. Os óculos baixos no nariz. Um coque caído no pescoço. Roupa de cores escuras, meia calça transparente, pés enfiados em um sapato de salto alto e bico fino. Séria, muito séria. Por que quem podia sorrir dentro de um ambiente tao frio?
Fez alguns amigos, nao muitos porque era muito calada. Mas saía para comer com eles e se divertia mais do que imaginava. Mas se entristecia de novo ao voltar ao ecritório, naquela sala pequenina, sem janelas, cheia de papéis empilhados ao seu redor.
Cristina conheceu no escritorio o homem mais bonito que jamais vira em sua vida. Homem sempre sorridente, homem de cabelos dourados como o sol. Ele passava e seu dia se iluminava. Sempre vinha comprimentá-la com um chocolate ou uma flor. Sempre com uma palabra amigável.
Cristina nunca o amou. Cristina só sabia amar o sol. Mas o apreciava por dar-lhe atençao. Ele sim a amava. Cristina era alguém que emanava simplicidade, ingenuidade. Necessitava alguém que cuidasse dela. E ele se propos a isso. Almoçavam juntos, conversavam depois do trabalho. Cristina até o convidou para tomar um café. E contou sua história de amor com o sol. Ele achou graça.
O tempo passou e o sorriso triste de Cristina o cativou mais e mais. Só ele via como os olhos de Cristina se perdiam na janela lá no fundo do corredor. Só ele via Cristina soltar o cabelo preso naquele coque sem graça, para formar cachos rebeldes. Só ele via um meio sorriso quando um pássaro passava na frente da pequena janela.
E quis mais. Cansado de ve-la de longe, quis ve-la de perto, e assim, de repente, levando uma rosa, a pediu em casamento. E viu Cristina empalidecer. Viu os olhos brilharem um pouco, mas logo se apagarem e escaparem até a janela do fundo. E soube, soube naquele momento, que nao poderia, que embora necesitasse proteçao, Cristina era uma alma livre. Lhe deu um sorriso triste, deixou a rosa em sua mesa e se foi, a tristeza pesando no coraçao.
Naquele dia Cristina se cansou de olhar. Se cansou de imaginar. Se cansou de ser triste. De supetao, levantou do seu esconderijo de papel e cruzou o corredor decididamente. E abriu a janela. Todos olharam-na espantados. Cristina abrira a janela! Inspirou o ar puro e o sol tocou seu rosto. Sem sentir, sem se dar conta, pulou a janela, voando em direçao ao sol.
Alguns dizem que Cristina nunca chegou a tocar o chao. Que o vento, finalmente teve pena dela, erguendo-a e levando-a ao encontro de seu destino. Outros acreditam que Cristina nunca se jogou daquela janela, que simplesmente, foi-se para sempre daquele escritorio para viajar pelo mundo.
Eu nao sei, porque nao estava. Sei que hoje em dia aquela janela esta sempre aberta. Acho que é porque ele segue esperando que Cristina volte, voando, por aquela janela, já sem o sorriso triste. Volte para levá-lo junto com ela rumo à felicidade.
Aqui começa minha viagem. Antes mesmo de pegar o avião. A mochila ainda desfeita no chão. Indo atás de tudo assim, meio de última hora. Meio sen planejamento. Sei onde vou chegar, sei onde quero ir em seguida. Depois, espero que a própria Índia me leve.
Passagem comprada, dinheiro tirado, saco de dormir (finalmente) comprado. A eterna pergunta do que estarei esquecendo.
Dar de baixa nas contas, jogar todo o inútil fora. O mais difícil, despedir-se dos amigos. Mesmo que por pouco. Mesmo que o tempo seja relativo.
Mas isso é o bom de uma viagem, conhecer mais gente, entrar em contato com uma nova cultura. E deixar os laços e os apegos. Bom, não deixá-los, adiá-los, guardá-los. Até outra vista.
Enfim, aqui vou eu. A vida me espera. Aqui começa minha aventura.

domingo, 6 de setembro de 2009

Relações Humanas

Como pode ser que a felicidade não chegue assim, imediata, quando (e se) finalmente encontramos nosso príncipe encantado? Nós, mulheres, fomos criadas aprendendo que a felicidade viria ao encontrá-lo. Não foi isso que aprendemos (ainda que por osmose) ao brincar de Barbie e Ken, ver a Bela e a Fera, Cinderela, Branca de neve, A pequena sereia e sei lá mais o que enquanto os meninos brincavam de carrinho e guerra lá fora?
Pois parece estranho que, seguindo o conceito de toda essa criação, não tenhamos encontrado a felicidade nem com o primeiro, nem com o segundo e nem com o terceiro amor. Talvez com esse, um pouco mais, talvez seja o homem certo, mas a felicidade parece não ser completa. Ainda estão as brigas por coisas tontas e nem tão tontas assim.
Imagino que todos nós, quando nascemos, somos como uma caixa vazia. Para quem acredita em vidas passadas, será uma caixa vazia mas com fundo falso. Sob esse fundo falso, desconhecido por nós, se escondem todas as experiências e traumas de outras vidas. Para quem não acredita nelas, pois imaginemos uma caixa vazia de todo.
Pouco a pouco vamos enchendo a caixa. Primeiro de sensações. Frio, calor, fome. Pouco a pouco vão chegando as emoções, amor, raiva, felicidade, tristeza. Depois vão nos metendo uma série de informações conturbadas, temos nossos primeiros medos, preconceitos, traumas. E criamos uma carapaça para nos proteger. Para tentar proteger aquela mesma caixa que antes estava vazia e agora já transborda.
Transborda tanto que é difícil lidar e ter paciência para o conteúdo interno de outras pessoas. Não somos mais que caixas transbordantes, incapazes de esvaziar o que tem dentro. Entãos surgem as brigas dos egos, cada um tentando proteger o conteúdo de sua caixa, guardado como um tesouro por tanto tempo.
Assim somo nós, homens. Até que entandamos que a felicidade não chegará através de um príncipe encantado. Não chegará através do conteúdo da caixa de terceiros. Chegará quando, e somente quando, esvaziarmos nossas caixas, descobrirmos o fundo falso, descobrirmos também o que está lá, aprendendo sobre cada momento, sentimento, emoção ou sensações guardados e depois jogando-os fora. Só assim seremos livres.
E felizes.

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Working day

Mais uma segunda de sol. Mais uma segunda trabalhando. Minha mesa fica virada de costas para a janela. Por uma questão de estética. As cortinas, sempre fechadas para não dar reflexo nos computadores. O ar condicionado a temperaturas mínimas. E o dia lá fora chamando.
Mais um dia perdido. Perâmbulo de vida. O sol canta e o escritório chora. Frio invernal num lindo dia de verão. Cansei de ver a vida passar. Cansei de ver o sol com a nuca.
Resolvi deixar minha vida nas mãos do destino. Resolvi não me preocupar e aceitar o que o dia-a-dia me der. Caminhar no calor do sol. Ou molhar-me nas tormentas de verão. Assim, sem esperar nada, agradecendo tudo, vivenciando cada dia.
Resolvi viver.

sábado, 18 de julho de 2009

Livro em branco

Engraçado que quanto menos temos mais livres nos sentimos. Incrível a sensação de liberdade que sentimos ao ter menos, ao abrirmos mão do que temos. Ao resolver deixar tudo atrás. Ao resolver reescrever uma nova página, inesperada, no nosso livro da vida. Por que não deixar tudo, experimentar algo novo, deixar os medos atrás e aventurar-se nesse imenso mundo.
Digo porque é o que sinto nesse momento. Momento que empacotar o pouco que tenho, de mandar embora, de ficar com apenas uma mochila e ir a uma terra desconhecida. A felicidade de ver as paredes em branco, de ver as prateleiras vazias, de sentir as costas vazias das responsabilidades desnecessárias que pouco a pouco vamos adquirindo.
A única responsabilidade é ser feliz. Como sermos felizes em um escritório, buscando somente a felicidade do bolso? Desde quando o dinheiro traz a felicidade?
Quero sentir a lierdade de não planejar, de deixar que as coisas me passem sem esperar por elas, quero ser supreendida pela vida. Quero deixar que meus pés guiem meus passos errantes, que me levem aonde o destino escolher.
Quero escrever um novo capítulo nesse eterno suspense que é minha vida.