quinta-feira, 5 de julho de 2012

A volta à Essência

Falando de simplicidade me vem a mente a Etiópia. Eu e uma amiga fomos em um mosteiro fora do roteiro turístico - e a Etiópia não é um lugar muito turístico, então só imagina onde fomos parar... Foram 4 horas de caminhada, o guia saltitando à nossa frente, tão ágil como uma cabra, e cada uma de nós com 15 quilos nas costas, descendo montanhas e mais montanhas, em trilhas secas e escorregadias, em beiras de penhascos - e não ajuda o fato de estar usando um nike com a sola mais lisa que picolé de frutas. A paisagem, claro, fantástica, mas a preocupação de fazer um voo fatal me tirava do sério. Enfim, quando o mal humor já era parte de mim há mais tempo do que gostaria de confessar, chegamos a um pequeno vale, com algumas cabanas feitas de madeira e pau a pique. Olha, não sei se as varas verdes tremem, pois nunca vi nenhuma, mas considero que naquele dia entendi a expressão porque as pernas tremiam tanto que era difícil ficar em pé. Um padre veio nos receber, boquiaberto, éramos as primeiras mulheres brancas a chegarem ali. Explicamos, através do guia, obviamente, que queríamos ficar ali e nos foi dado o estábulo, o único lugar que sobrava ali. Dormíamos olhando as estrelas através das paredes de galhos. O único porém foram as pulgas, essas me assaltaram pelo resto da viagem, sem trégua, mas prefiro romantizar e não lembrar delas. Do outro lado do riacho moravam as mulheres, e no dia que fomos visita-las, nos sentaram em um quarto cheio de teares, e nos encheram de comida - deviam achar que não nos alimentávamos bem porque certamente não era normal que duas pessoas jovens como nós tivessem tanta dor nas pernas só por causa de uma caminhada. Nossa única comunicação eram mímicas e risadas. Os pés calçados em chinelos gastos, o corpo em roupas remendadas. As casinhas, ou melhor, quartinhos onde moravam, de pau a pique a chão de terra batido. A cama, apenas um cobertor sobre o chão e um mosquiteiro para proteger. Algumas panelas, um ratinho correndo daqui para lá, e só. Mas tinham tudo o que precisavam , vaquinhas para tirar leite e fazer ricota, banana, milho e o grão que faz a farinha fermentada deles - tefl, ou algo do gênero. De que mais precisavam? Quando íamos embora uma das monjas nos fez massagem nas pernas ainda doloridas. O fez com o mesmo amor que recebeu lambidas carinhosas de uma vaca. Dei meu xale para agradecer, dei meu chinelo, teria dado tudo, mas ela não queria nada, foi difícil fazê-la aceitar qualquer coisa. Foi ali que entendi o que era viver uma vida sem precisar de muito, porém sem tantas preocupações e desejos. Foi ali que vi a simplicidade, não só da vida, também da alma. Ali foi onde compreendi a verdadeira felicidade.

Nenhum comentário: